quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

Crônicas do Rei de Umbigo

I


Ela continuava do mesmo jeito de sempre. Ainda tinha a mesma família, os mesmos amigos, a mesma cara, a mesma personalidade – talvez um pouco mais forte, amadurecida pelo tempo, mas ainda a mesma. Nenhuma mudança muito drástica, contando que sempre fora meio sentimental e chorasse às vezes. Ainda ia a festas. Ainda beijava. Ainda sofria. Ainda dava seus pulos pra seguir em frente. Ainda era romântica, e muito. A única coisa realmente diferente era que, de uma hora pra outra, ela se tornara o centro do mundo.
Ok, talvez não de uma hora pra outra. Talvez por resultado de alguns pontos importantes acumulados ao longo de uma adolescência prazerosa, embora rápida e cheia de altos e baixos. O mimo ganhado sem esforço e os amores, vários amores, podem ter ajudado a formar esse ideal de mulher que tudo pode e com quem quiser, o que a coloca no topo não apenas do seu mundo como também, ela diz, do mundo de qualquer homem. E não era preciso ser dos mais observadores pra reparar que, de repente, todas as cantadas e olhares alheios começaram a recair sobre ela, todas as previsões de horóscopo, alinhamentos planetários, coincidências e frases clichês se adequaram como se feitos exclusivamente pra contar a sua história. Mas talvez uma ou outra das várias boas amigas que tinha notasse que as teorias já não se encaixavam aos fatos, mas sim os fatos iam sendo distorcidos pra caber dentro das teorias. E então as cantadas, olhares, horóscopos, alinhamentos planetários, coincidências e frases clichês se reduziam ao que lhe convinha, ou pelo menos ao que ela desejava.
Mas essas mesmas amigas jamais se atreveriam a dizer isso a ela. Não por medo de serem tachadas como invejosas que não eram ou pra não perder uma amizade construída ao longo de anos. Não diziam nada porque ela estava bem, ou pelo menos parecia estar bastante satisfeita consigo mesma. Elas sabiam, entre  olhares de compreensão muda, que aquele poço de sorte no qual caíra subitamente era, na verdade, a tentativa desesperada de um último fôlego pra quem há muito se afogara em azar. Cansada de esperar que a vida se desse um jeito, ela decidiu que seria feliz, com ou sem o aval do destino.

quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

antes tarde que nunca #1


Deitada naquele abraço, descobri que a felicidade era um som - profundo, aveludado, seguro, vital.
Ecoando de dentro do peito dele.
Ecoando nos meus sentidos.
Ecoando no universo e em tudo ao redor.

De repente, a maior necessidade do mundo era continuar ouvindo.


Pelo que dizem por aí e na falta de inspiração pra oferecer algo bom e novo, vou publicar uma meia dúzia (ou nem isso) de bobagens que escrevi quando alguém ainda lia esse blog antes que seja tarde demais. Há uma grande quantidade de pessoas acreditando ou desconfiando que no dia 21/12/2012, hoje conhecido como "nessa sexta-feira", o mundo terá seu ponto final. Não que os maias precisassem dizer - eu, particularmente, acho que já demos motivos suficientes para que nosso planeta se esvaísse por outros meios, não menos catastróficos, mas hoje encarados com normalidade num cotidiano caótico por si só. Depois de inúmeros debates comigo mesma, aceitei silenciosamente a existência de algo maior que eu; convenhamos, não é muito difícil - somos pequenos demais. Alguns chamam de Deus, e tenho certeza que minha mãe absolutamente religiosa gostaria que eu também assim chamasse. Minha concepção, se é que tenho uma, difere das palavras que ouvia todos os domingos na igreja desde que era muito pequena pra sossegar no banco e prestar atenção durante a missa. Não tenho uma definição, mas guardo um sentimento. Sem entrar no mérito da questão, acredito que essa força em que se insere não apenas nosso mundo, mas tudo que existe e ainda há de existir, não segue o calendário (assim como nem todos os povos contam seus dias da mesma forma) e não tem um relógio de pulso.
Mas e se nós soubéssemos o dia exato do fim do mundo?
Passei as últimas noites me fazendo essa pergunta e cheguei à conclusão de que talvez não deixássemos tantas coisas inacabadas por aqui. A verdade é que todos temos planos pra daqui a muito tempo, como prestações a perder de vista que preferíamos esquecer. Então, para evitar pendências, muitos tentariam fazer em uma semana o que não conseguiram concretizar numa vida inteira. Juro que preferia não ser agraciada com a privilegiada informação dos maias. Quem sabe assim tentasse colocar em prática todos os dias os planos de longo prazo, sem empurrar pro amanhã a responsabilidade de fazer diferente, de ser diferente e, com sorte, um pouco melhor.  Mas, ultimamente, na falta de ideias, estou abraçando qualquer causa que possa reavivar minha vontade de escrever. Gostei do tema. Hoje é quarta-feira - tenho dois dias e a oportunidade de publicar os rascunhos que não tive coragem ou disposição pra divulgar antes.
Se eu puder deixar algo (de bom, espero), que sejam minhas palavras.

Eis minha forma de prestar contas com a vida.
Antes tarde que nunca. 

sábado, 6 de outubro de 2012


É que me deu vontade de dizer que sinto sua falta. Não, a sensação não asfixia, não me faz chorar. Talvez esse meu orgulho de mulher-quase-independente não seja pura pretensão de quem quer começar a pagar suas contas o quanto antes, mas deve ter força suficiente pra empurrar meus passos ao trancos enquanto eu penso em me sentar num cantinho e aguardar sua chegada pacientemente. "Ando por aí querendo te encontrar", é verdade, e a vida não tem colaborado abertamente nesse sentido. Já me enchi de raiva, raiva de Deus e do mundo inteiro, raiva de acordar sem repassar mentalmente a roupa que vou vestir pra te encontrar, raiva de dormir sem o frio na barriga que sucede a lembrança "ele vem amanhã", raiva da segunda-feira porque domingo foi embora, raiva do sábado que não chega, raiva desse celular que não toca. Raiva amarela o sorriso e deixa na boca um gosto amargo que nem chocolate - nem uma caixa de Lacta - consegue tirar. Quando ter raiva não te trouxe de volta, meu peito simplesmente se esvaziou. Falta. Sua falta. Aprendi a ignorá-la e encontrei mais um disfarce que um remédio. Espero por você tapando o sol com uma, duas, quantas peneiras forem necessárias, pois esse negócio de melodrama não foi feito pra mim. Tive experiências suficientes pra entender que minhas palavras descrevendo um amor platônico e cheio de frufrus são como um ogro tentando vestir uma saia de balé. É possível morrer de saudade todos os dias e continuar vivendo; bem mais que possível, é preciso. Se não faço de sua ausência o centro da minha existência, não significa que te deixei se ausentar de mim. Não te amo menos, ao contrário, me desdobro tirando de trás da orelha uma forma de ir em frente e te levar no meu enlaço pra te amar sempre um pouco mais. Me deu vontade de dizer que sinto sua falta - agora, ontem, há menos de um segundo e em todo tempo daqui até você voltar.